Ministério alerta para risco da volta da
poliomielite em 312 cidades do País
Estão na lista os municípios que não
conseguiram atingir nem 50% da cobertura vacinal. A situação mais grave é na
Bahia, onde 15% dos municípios imunizaram menos do que 50% das crianças. Último
registro da doença no Brasil foi feito em 1989
O Ministério da Saúde admite
haver alto risco de retorno da poliomielite em pelo menos 312 cidades
brasileiras – 44 no Estado de São Paulo. O alerta foi feito nesta quinta-feira,
28, em uma reunião com secretários estaduais e municipais de saúde. “É uma situação
gravíssima”, afirmou a coordenadora do Programa de Imunização, Carla Domingues.
Estão na lista de maior
risco para pólio municípios que não conseguiram atingir nem 50% da cobertura
vacinal. “Uma cidade com esses indicadores tem todas as condições de voltar a
transmitir a doença em nosso País. Será um desastre para a saúde como um todo.”
O último caso registrado no Brasil foi em 1990. Quatro anos depois, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a doença erradicada das Américas.
A recomendação é de que a
cobertura vacinal contra pólio seja superior a 95%. A situação mais grave é na
Bahia, onde 15% dos municípios imunizaram menos do que 50% das crianças,
seguido do Maranhão, com 14,29%. Em todo o País, apenas Rondônia, Espírito Santo
e Distrito Federal não têm cidades sob risco elevado.
O quadro geral é muito
preocupante. Pelos dados do Ministério da Saúde, no ano passado 22 unidades da
federação não atingiram a cobertura considerada ideal. Também em 2017 pelo
menos 800 mil crianças estavam sem o esquema completo de vacinação – que
compreende três doses do imunizante.
“Acendemos a luz vermelha”,
resumiu Carla. A preocupação ganha corpo sobretudo em um momento em que voltou
a ser discutida a entrada do poliovírus derivado. Na Venezuela, autoridades
sanitárias cogitaram a possibilidade de que uma menina teria sido contaminada
por essa mutação do vírus.
Quando a vacina em gotas é
dada para a criança, o vírus atenuado contido no imunizante pode ficar presente
no ambiente por quatro a seis semanas, criando o que se chama de efeito
rebanho. De quebra, a população que tem contato com o vírus atenuado também
fica protegida contra a doença.
O problema é que nesse
período, em raríssimas ocasiões, o poliovírus pode ter contato com outros vírus,
como o rotavírus, sofrer uma mutação e, com isso, criar uma nova onda de
infecções. Essa hipótese foi descartada no caso da criança venezuelana, mas a
preocupação persiste.
A presidente da Sociedade
Brasileira de Imunização, Isabella Ballalai, observa que o risco aumenta nos
casos em que a cobertura vacinal é menor. “Daí a necessidade de a imunização
ser, sempre, mantida em 95%.”
Isabella classificou o
indicador brasileiro como “inacreditável e inadmissível”. Carla observa que a
queda mais expressiva ocorreu nos últimos dois anos. Para tentar reduzir o
risco, o Ministério da Saúde deverá fazer entre os dias 6 e 31 de agosto uma
campanha nacional de vacinação contra pólio.
Outras doenças
Carla reforça ainda que as taxas de cobertura
vacinal no País caíram de forma expressiva. “Parece que estamos retomando à
década de 80 com as cobertura vacinais.” Como exemplo, ela citou as vacinas
tríplice viral (sarampo, rubéola e caxumba), pentavalente (difteria, tétano,
coqueluche, meningite por Haemophilus influenzae tipo b e poliomielite) e
pneumococo. “Não houve desabastecimento em nenhum desses casos”, observou.
Para ela, os indicadores
mostram a necessidade de se refletir sobre o que está sendo feito na ponta da
assistência. Ela observa que o programa de imunização oferta 14 vacinas. “É
preciso ter simultaneidade. Montar um calendário de forma a ofertar, numa só
visita ao posto, mais de um imunizante.” No esquema ideal, afirma, os pais
levam a criança nove vezes durante o ano ao posto de vacinação. “Se isso não é
feito da forma adequada, esse número aumenta para 10, 11, 12”, observa.
A resistência em dar mais de
uma vacina no mesmo dia pelos profissionais de saúde poderia ser resolvida com
reforço na capacitação. O mesmo se aplica ao preenchimento das fichas de
vacina. Poucos são os municípios que seguem a recomendação de fazer registro da
vacinação nominal. “As anotações são feitas apenas por dose. Isso dificulta que
seja realizada uma busca das crianças que estão com calendário atrasado”, diz
Carla.
Horários
Para ela, é preciso também
maior racionalidade na forma da oferta da vacina, como horários mais flexíveis,
que se encaixem na rotina de trabalho dos pais. “Postos funcionam das 8h às 11
e das 14 às 17 horas. Não são todos pais que podem levar seus filhos nesses
horários várias vezes ao ano.”
A abertura de muitas salas
de vacina, por sua vez, seria contraproducente. “É preciso escala. As doses
precisam ser abertas e usadas rapidamente. Caso contrário, há desperdício.”
Por: Lígia Formenti, OEstado de S.Paulo
Foto: FABIO MOTTA/ESTADÃO
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