Fraude de telefonia móvel
tem se tornado cada vez mais comum no país. Golpistas roubam a linha de
celular, entram em aplicativos de trocas de mensagens, se passam pelas vítimas
e enviam mensagens aos amigos que estão na lista de contatos para pedir
dinheiro.
Uma das vítimas contou que
teve um prejuízo de aproximadamente R$ 8 mil. Amigos caíram no golpe e fizeram
a transferência bancária. As vítimas pediram sigilo à reportagem e, por isso,
aparecerão com nomes fictícios para que as identidades sejam preservadas.
“Na segunda à noite [1º de
abril], saí de casa e, do nada, meu telefone ficou sem sinal. Resetava a rede
móvel, tirava o chip e o sinal não voltava. Depois de um tempo, consegui me
conectar pelo Wi-Fi e percebi que estava acontecendo alguma coisa de
diferente”, relata um cliente da operadora Claro.
A princípio, João pensou que
se tratava de algum vírus. Porém, como o sinal não voltava, entrou em contato
com a operadora de telefonia móvel e, para sua surpresa, descobriu que a linha
não estava mais em seu nome e constava no CPF de uma outra pessoa.
“Liguei lá para contar o que
estava acontecendo e a atendente falou que o número não estava no meu nome.
Expliquei que a linha era minha há nove anos, mas meu número estava no nome de
outra pessoa. Foi aí que percebi que era uma coisa mais grave.”
Ainda sem sinal, João
decidiu, então, passar em uma loja da Claro para relatar o incidente. “Fiz todo
o procedimento e só depois disso fui para casa. Foi só aí que descobri que
nesse meio tempo os golpistas estavam se passando por mim”, contou. “Dois
amigos caíram na história que eles inventaram e transferiram o dinheiro.”
Os amigos de João
transferiram perto de R$ 5 mil. Mas o golpe não parou por aí. Com acesso a
todos os dados, os golpistas conseguiram também acesso à conta dele e fizeram
transferências bancárias. Somando o prejuízo dos amigos e o de João, o golpe
foi de R$ 8 mil.
“Eles entraram na minha
conta do banco online e pegaram todo o dinheiro que tinha lá. Como eles estavam
com o meu número, eles tiveram acesso ao código de segurança enviado pelo banco
e conseguiram entrar. Na verdade, eles tiveram acesso a tudo que é meu, todas
as minhas conversas de WhatsApp, tudo”, lamenta.
A vítima – que precisou
trocar de número e acabou mudando de operadora – fez boletim de ocorrência
sobre a fraude, precisou ir mais vezes à operadora, mas ainda enfrenta um
problema: como a linha não está em seu CPF, não consegue bloqueá-la.
“O pior de tudo é que quando
ligo lá e passo meus dados, eles dizem que não podem bloquear a linha porque
não está no meu nome. E sempre que entro no WhatsApp, vejo que eles estão
online.”
A outra vítima ouvida era cliente da Vivo. Os golpistas agiram da mesma maneira, na quarta-feira
(27), mas Lucas estava em um Wi-Fi e conseguiu perceber o golpe a tempo.
“Recebi um SMS que seria o
próximo cliente a ser atendido no shopping Mogi das Cruzes. Li a mensagem e
pensei que tinham mandado para a pessoa errada. Depois de uma hora, mais ou
menos, perdi o sinal”, relata.
João – que trabalha com
tecnologia de celular – logo entendeu que se tratava de um golpe. “Tentei
autenticar a rede, mas nada dava certo. Achei estranho. Comecei a receber um
monte de mensagem do meu banco com baixa de aplicações e agendamento de
transferência para pessoas desconhecidas. Acionei o banco imediatamente e
bloqueei a minha conta.”
Depois de conseguir entrar
em contato com o banco, a vítima ligou para a operadora e foi informado de que
a linha estava no CPF de outra pessoa desde 2016. Ele explicou o caso, mas não
obteve solução imediata.
“Tive que ir até a loja da
Vivo, deram baixa, mas até agora não sabem me dizer como fizeram isso”, declarou.
“Tentei bloquear meu WhatsApp, meus amigos começaram a me mandar mensagens e,
que eu saiba, nenhum deles caiu no golpe.”
João disse à reportagem que
não teve documentos furtados nem roubados e, por isso, não sabe como os
golpistas tiveram acesso aos seus dados. A vítima ainda contou que escapou do
prejuízo financeiro por pouco.
“Uma semana antes estava de
férias e viajando. Não estaria no Wi-Fi e eles teriam conseguido fazer o
golpe.”
Como não teve prejuízo
financeiro, a vítima diz acreditar que o caso vai ficar sem solução.
“Fiz BO, mas é frustrante
porque eu sei que ninguém vai fazer nada. Como não conseguiram pegar dinheiro,
acho que ninguém vai atrás”, reclama.
A reportagem entrou em
contato com o Procon-SP (Programa de Proteção e Defesa do Consumidor) para
saber como as vítimas devem agir após o golpe. Segundo a fundação, “o
consumidor deve ser orientado a procurar a autoridade policial para lavrar
Boletim de Ocorrência”.
Ainda de acordo com o
Procon, “ao final das investigações, caso a autoridade entenda pela
responsabilidade técnica da operadora de telefonia, do aplicativo ou de
terceiros, a responsabilidade poderá ser imputada a um destes, dependendo de
uma análise apurada de cada caso.”
Como se prevenir
Marcelo Lau, coordenador do
MBA em Cibersegurança da FIAP (Faculdade de Informática e Administração
Paulista), falou que a fraude já existe há, pelo menos, dois anos. Porém, os
casos estão aumentando nos últimos tempos.
De acordo com Lau, o golpe
“se baseia, de fato, em desabilitar os dados de um celular e habilitá-lo
temporariamente em outro”. Lau diz que só existe uma maneira de perceber o
golpe imediatamente: ausência de sinal da operadora.
“Tem que ficar desconfiado quando
perde o sinal do celular em condições normais. Nos dias atuais, as pessoas
trabalham com WhatsApp o tempo todo. Ao perceber que não está mais recebendo
comunicação, é preciso entrar em contato com a operadora imediatamente”,
orienta.
Ainda segundo ele, o que se
sabe até o momento é que, na maioria das vezes, as pessoas que cometem o crime
fazem parte de times de call center ou estão dentro da própria operadora.
“Eles transferem normalmente
a linha e têm acesso ao número. Com isso, se aproveitam de senhas enviadas por
SMS e, claro, também se utilizam para fazer o golpe em bancos e pedir dinheiro
por WhatsApp”, explica. “Acabam fazendo empréstimos, transferências e,
realmente, conseguem tirar dinheiro dessa maneira”, completa.
Se o golpe ficar comprovado,
Lau aconselha a anotar o máximo de detalhes possíveis – tais como data,
horário, prints de conversas feitas pelos golpistas – para lavrar um boletim de
ocorrência. “A empresa de telefonia celular é responsável, mesmo que o serviço
seja terceirizado”, diz.
Como o cliente não consegue
evitar o golpe por meios próprios – seja com aplicativos de segurança ou não
clicando em links sem credibilidade, uma vez que é feito por pessoas que
trabalham em call center ou nas operadoras – Lau orienta a usar os métodos de
segurança dos aplicativos.
“No WhatsApp, por exemplo,
tem a verificação em duas etapas. Se alguém entrar no aplicativo por um outro
lugar, você recebe a notificação na tela do celular e não por mensagens”,
explica. “No aplicativo do banco, por exemplo, uso um que pede a minha digital
todas as vezes em que acesso a minha conta. O Facebook também tem um ajuste de
segurança que manda um número de segurança que gera no próprio aplicativo”,
completa.
Ainda segundo Lau, os
métodos mais seguros são os que enviam notificações pela tela do celular.
Para as vítimas donas das
linhas, o professor orienta a troca de todas as senhas dos aplicativos no
smartphone. Porém, é preciso cuidado redobrado ao realizar as alterações. “Só
precisa prestar atenção para que não sejam senhas que precisam ser confirmadas
por SMS, porque senão você troca de senha e o golpista que ainda está com a sua
linha vai ter a nova senha também.”
O conselho para as pessoas
que recebem mensagem de amigos pedindo dinheiro é um pouco diferente. “No caso
de contatos que tenham sido abordados, vale, talvez, ligar para o amigo antes
de fazer o empréstimo e provar que esse problema ocorreu e ver para qual conta
está transferindo”, diz ele.
Para concluir, Lau aconselha
a usar o Google Authenticator, um serviço gratuito que gera códigos para a
verificação em duas etapas no smartphone.
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