Saúde, humor, peso e ética estão entre os principais motivos para a adoção de dietas - Pesquisa examinou as relações entre comportamento restritivo, emocional e descontrolado, além dos motivos para escolha dos alimentos
Em estudo divulgado no periódico Perceptual and Motor Skills,
pesquisadores do Brasil e de Portugal investigaram as principais razões pelas
quais as pessoas adotam dietas restritivas, ou seja, eliminam por completo
certos alimentos de seu cardápio. Entre os participantes, os fatores mais
associados a esse comportamento alimentar foram saúde, humor, controle do peso,
preocupações éticas e relacionadas ao consumo de produtos naturais.
Conduzida por cientistas da Universidade Estadual Paulista
(Unesp), da Universidade Federal de Alfenas (Unifal) e do Instituto
Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida (Portugal) com apoio
da Fapesp, a pesquisa envolveu 1.200 adultos (69,5% mulheres) com média de
idade de 25 anos. Os autores também analisaram as motivações por trás de outros
dois tipos de comportamentos alimentares denominados “emocional” e
“descontrolado”.
Enquanto os hábitos alimentares de uma pessoa se referem à
forma como ela lida com os alimentos de forma prática, ou seja, como os
seleciona, prepara e consome, seus comportamentos alimentares dizem respeito a
questões mais subjetivas e individuais, como contexto sociocultural, aspectos
psicológicos, estímulos sensoriais e estado de humor. Entender o que ativa e
motiva esses fatores pode ajudar especialistas a modelar intervenções clínicas
e a tratar comportamentos de risco para transtornos, além de promover escolhas
alimentares positivas, adequadas e saudáveis – missão fundamental no atual
cenário de grande disponibilidade e oferta de alimentos, especialmente de alto
teor calórico.
A partir de dados coletados por meio de dois questionários
(Three-Factor Eating Questionnaire e Food Choice Questionnaire), foram
examinados nos participantes três comportamentos alimentares marcantes na
população brasileira: restrição alimentar cognitiva, em que se restringe a
alimentação intencionalmente por meio da adoção de qualquer tipo de dieta;
alimentação emocional, guiada por sentimentos; e descontrole alimentar,
caracterizado por excessos (consumo de grandes quantidades em um curto
período).
Os pesquisadores relacionaram, então, cada um dos
comportamentos a nove motivos subjacentes às escolhas alimentares: saúde,
humor, conveniência, apelo sensorial, conteúdo natural, preço, controle do
peso, familiaridade e preocupação ética. Isso foi feito por meio de uma técnica
estatística chamada modelagem por equações estruturais, que analisa via números
a relação entre variáveis que supostamente seriam vistas como não observáveis,
como estado de humor e intenção de restringir o consumo de alimentos.
“Observamos que, quanto mais as pessoas restringem
cognitivamente sua alimentação, mais escolhem os alimentos por questões de
saúde, humor, conteúdo natural, controle do peso e preocupação ética”, diz o
nutricionista Wanderson Roberto da Silva, professor do Programa de
Pós-Graduação em Alimentos, Nutrição e Engenharia de Alimentos da Unesp e
primeiro autor do estudo. “Já quem se alimenta de forma emocional, é mais
guiado pelo humor do que por saúde ou presença de conteúdo natural – resumindo,
há maior suscetibilidade de esses adultos optarem por alimentos considerados
palatáveis, como aqueles ricos em açúcares e gorduras.”
“E, por fim, pessoas sem controle sobre a alimentação, ou
seja, que comem sem pensar em quantidade, horários ou porções, escolhem seus
alimentos por conveniência, ingerindo o que há na frente pelo fato de serem
atrativos, por apelo sensorial, preço ou familiaridade.”
Novas
abordagens
De acordo com os cientistas envolvidos no trabalho, essas
descobertas podem orientar pesquisas futuras diversas sobre comportamento
alimentar, inclusive com estudos semelhantes replicados em populações com
estilos alimentares ou doenças específicas, como diabetes e hipertensão.
Outra contribuição importante do estudo é ajudar a guiar
profissionais da área de saúde e gestores de políticas públicas na elaboração
de estratégias para estimular comportamentos alimentares alinhados com o que
atualmente se considera uma alimentação saudável e adequada ao contexto
socioeconômico e cultural em que cada pessoa está inserida, sem restrições
severas e atitudes inflexíveis. Isso vai ao encontro do que é preconizado pelo
Guia Alimentar para a População Brasileira, publicado pelo Ministério da Saúde.
“Nossos achados destacam que investir em mudanças dietéticas
pensando apenas no que se consome tem grandes chances de falhar. Dietas
altamente restritivas, por exemplo, tendem a gerar comportamentos inflexíveis e
obsessivos, que causam dificuldades biopsicossociais, como deficiências de
nutrientes, afastamento de ambientes sociais e sofrimento emocional”, diz
Silva.
“Não estamos romantizando o cenário e afirmando que nunca
seja necessário reduzir a quantidade consumida de alimentos, inclusive porque
vivemos uma epidemia de sobrepeso e obesidade. Mas é preciso que o acompanhamento
profissional seja mais harmonioso e vá além de falar o que as pessoas têm de
comer ou deixar de comer. Temos de entender a relação que se estabelece com a
comida, as emoções e os motivos envolvidos para, então, propor alterações que
façam sentido individualmente e tenham potencial de se tornar mais efetivas e
evitar prejuízos no longo prazo.”
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