Proibição do uso e comercialização da mistura de pó de vidro e cola completa 5 anos; desrespeito à medida ainda provoca ocorrências graves |
Uma brincadeira que colore o céu e atravessa gerações. Soltar pipa é uma das recreações preferidas das crianças e faz muito adulto relembrar os bons tempos de brincar nas ruas, campos e praias. Basta "dar linha", como dizem os adeptos, e deixar o vento levar o brinquedo o mais alto possível.
"Eu solto pipa desde a infância. Hoje, com 36 anos, sou
pai e ensinei para o meu filho. Mas, costumamos brincar com as pipas somente
quando estamos na praia. Na cidade é muito perigoso", relatou o
comerciante Marcelo Prudente da Silva, que quer assegurar a diversão em
família.
O perigo a que Marcelo se refere é o cerol usado na linha da
pipa. A mistura de pó de vidro com cola é fixada na linha pra cortar outra pipa
fazendo com que ela caia no chão. Mas o que parece ser uma brincadeira pode se
transformar em acidentes.
A Lei
Foram justamente os riscos de ferimentos graves e de morte
que motivaram a criação de uma lei na Assembleia Legislativa do Estado de São
Paulo. O então deputado Coronel Telhada criou a Lei 17.201/2019, que proíbe o
uso e comercialização de cerol no estado.
O texto completou 5 anos nesta segunda-feira (4) e proíbe o
cerol e outros materiais cortantes que possam ser aplicados nas linhas. A
proibição abrange o uso, a posse, a fabricação e a comercialização da mistura,
também conhecida como linha chilena.
Quando a lei foi sancionada, Coronel Telhada, hoje suplente
de deputado federal, disse que garantir a segurança foi a principal razão da proposta.
"O cerol já está proibido por lei. O projeto é bem mais específico para
extirpar este problema em São Paulo. Pessoas têm sofrido acidentes graves,
estamos falando em salvar vidas", declarou na época, ao portal da Alesp.
Caso a lei seja descumprida, a pessoa que usar o cerol pode
ter que pagar multa de quase R$ 2 mil. No caso do estabelecimento que
descumprir a regra, a multa pode chegar a R$ 132 mil reais. "A lei criada
pela Alesp ajuda a salvar vidas", comentou o motociclista e socorrista
mecânico, Clébio Santana da Silva, morador de Taboão da Serra, na região
metropolitana de São Paulo.
Antena
Para se proteger, motociclistas e ciclistas passaram a
circular nas cidades paulistas com antenas instaladas no guidão. "Por
todos os lugares que passo, a antena está suspensa. É a única forma de se
prevenir de acidentes com a linha de pipa com cerol", contou Edson Couto
de Oliveira, motoboy e prestador de serviços, que passa mais de 8 horas por
dia, sobre duas rodas.
A proteção é fundamental. Segundo dados da Secretaria
Estadual de Saúde de São Paulo, os atendimentos provocados por acidentes com
pipa aumentaram em 139% nos ambulatórios do estado. De janeiro a maio do ano
passado foram 555 casos. No mesmo período deste ano, foram 1.326 ocorrências.
As vítimas eram motociclistas, ciclistas e pedestres.
Clébio Santana da Silva escapou de um ferimento grave ou até
fatal. "Eu saí com a moto em baixa velocidade e não fechei o prendedor do
capacete, abaixo do queixo. Um erro que acabou salvando a minha vida",
contou. "Eu não vi a linha da pipa que veio na direção do meu pescoço e
cortou, justamente, o tecido do prendedor do capacete", relatou Clébio,
emocionado ao relembrar a sorte que teve naquele dia.
Quem também corre risco com o cerol são as crianças e
adolescentes que ainda mantém o hábito de brincar nas ruas, especialmente em
pequenos municípios paulistas. Eles correm o risco de não perceber que a linha
com cola e vidro está enroscada na rede elétrica e podem sofrer queimaduras.
"O risco que a gente corre é constante. A lei está aí, é
boa pra nossa segurança, mas é preciso conscientização das pessoas que ainda
insistem em usar cerol", alertou o motoboy Edson de Oliveira, que vai
instalar mais uma antena na moto para garantir que as linhas com cerol fiquem
bem longe dele.
Há 3 mil anos
A pipa é também conhecida como papagaio e tem outras dezenas
de denominações de acordo com a região do país. É um brinquedo popular e de
baixo custo, feito com papel. Existem modelos prontos e de formas variadas.
Quando confeccionado à mão, é um estímulo à criatividade, além de ser um
brinquedo que voa de acordo com a força do vento e exercita a habilidade de
quem a solta.
Mas, antes de ser a pipa que conhecemos, o objeto era
utilizado como um dispositivo de sinalização militar no ano 1.200 antes de
Cristo, na China Antiga, ou seja, cerca de 3 mil anos atrás. Ao longo dos
tempos, ajudou em estudos meteorológicos até se tornar um dos brinquedos mais
populares entre as gerações. O que tira a graça da brincadeira é mesmo o uso do
cerol.
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