Mesmo com o fim de setembro, mês de referência para a
campanha de prevenção ao suicídio, o tema não se encerra com o calendário. Em
duas entrevistas realizadas pelo F5 Conchal, o psicólogo Mike Justino, que atua
na rede pública do município, e a psicóloga Raquel Narida Macedo, do CAPS
Conchal, detalham sinais de risco, mitos e verdades, o funcionamento do serviço
especializado e por que buscar ajuda profissional sem medo ou preconceito é
decisivo para salvar vidas.
Os profissionais reforçam que tristeza prolongada, alterações
importantes no sono e no apetite, lutos não elaborados, uso abusivo de
substâncias, automutilação e prejuízos nas relações e no trabalho são sinais de
alerta que merecem atenção. Segundo Mike, quando sintomas persistem por semanas
ou meses e passam a “tirar cor da vida”, é hora de procurar atendimento: “A linha entre
um luto esperado e um quadro depressivo é o tempo e o impacto na vida
cotidiana. Se o sofrimento se prolonga e começa a comprometer trabalho,
vínculos e autocuidado, já é um alerta.”
A relação terapêutica aparece como elemento central do
cuidado. Mike explica que a confiança entre paciente e profissional é
construída, não imediata: “Trabalhamos com a subjetividade humana. É importante
refletir se há identificação com o profissional e, ao mesmo tempo, se o próprio
paciente está conseguindo se abrir para o processo.” Em cidades pequenas, observa ele, o receio de
exposição muitas vezes leva famílias a buscarem atendimento fora da rede local.
O ponto, porém, não é o endereço do consultório, e sim a qualidade do vínculo e
a continuidade do tratamento.
Raquel destaca o papel da rede de apoio para reduzir riscos
em momentos de crise. O isolamento, que ela chama de “embotamento social”,
costuma aumentar a vulnerabilidade. “É fundamental que amigos e familiares cerquem essa
pessoa de cuidado, incluam em atividades e, se necessário, acompanhem até a
UBS, o CAPS ou a emergência hospitalar.” Minimizar a dor (“é só para chamar atenção”)
é um erro comum: “Mesmo quando a busca por atenção existe, ignorá-la agrava o
sofrimento e pode precipitar condutas autolesivas.”
Sobre depressão, ansiedade e bipolaridade, Mike lembra que
esses transtornos alteram a percepção de si e do mundo e podem levar a soluções
imediatistas para interromper a dor — daí a importância do acompanhamento
técnico, que hoje reúne evidências, profissionais capacitados e serviços
estruturados. Em Conchal, o CAPS funciona como serviço substitutivo dos antigos
manicômios e atende transtornos mentais severos e persistentes, bem como álcool
e outras drogas, com equipe multiprofissional (psicologia, psiquiatria, serviço
social, enfermagem e técnicos). Há acolhimento presencial, de 7h às 15h30, com
entrada por demanda espontânea no eixo de álcool e drogas e por encaminhamento
médico (UBS ou hospital) para outras condições. O equipamento está localizado
na Rua Minas Gerais, bairro Planalto.
A distinção entre psicólogo e psiquiatra também ajuda a
orientar a busca. O psicólogo trabalha conteúdos emocionais e experiências que
precisam ser elaboradas; o psiquiatra atua pelo eixo biológico, com avaliação e
manejo medicamentoso. “São frentes distintas que se complementam”, resume Mike. E, sim:
profissionais de saúde mental também fazem terapia. “Quem cuida, também precisa
ser cuidado. É assim que garantimos qualidade e ética no atendimento”, completa.
Nas entrevistas, os dois especialistas comentam ainda a
influência do ambiente social. Vulnerabilidade econômica, falta de acesso a lazer,
esporte e cultura e rotinas de trabalho extenuantes elevam o estresse e a
ansiedade. Raquel observa que a “era da resposta imediata” nas redes acentua a
impaciência e a angústia, ao mesmo tempo em que distancia o encontro “olho no
olho”. A mídia e as plataformas podem ajudar na prevenção, disseminando
informação responsável, mas a romantização de temas sensíveis — como
automutilação — é contraproducente. Falar abertamente, de forma técnica e sem
glamourizar, protege.
No ambiente escolar e de trabalho, a prevenção passa por
reconhecer diferenças, ampliar repertórios e criar canais de escuta. Políticas
que incluam práticas esportivas, artísticas e formas variadas de avaliação e
participação reduzem exclusões e conflitos. O bullying, aponta Raquel, é expressão
da dificuldade de lidar com o diferente; enfrentá-lo requer abraçar a
diversidade como valor, não como ameaça.
Para o cuidado cotidiano, Raquel recomenda técnicas de
concentração que “trazem a pessoa de volta para o corpo e para o presente”:
leitura, meditação, música, um banho demorado, pequenas rotinas de prazer e
organização. E alerta para as “muletas” — álcool, drogas, jogos, comida, até
práticas socialmente aceitas — que podem funcionar como fuga, mas não tratam a
causa. Identificá-las é parte do caminho terapêutico.
Por fim, os entrevistados pedem que a população confie nos
serviços e combata o estigma. Em entrevistas anteriores, o CAPS informou que
cerca de 5% da população de Conchal já foi atendida em algum momento — um
indicador de demanda real e da necessidade de fortalecer a rede. “O serviço é de porta aberta e sigiloso. Acolhemos quem
precisa e quer ajuda”,
reforça Mike.
Serviço
— onde buscar ajuda em Conchal
• CAPS Conchal – Rua Minas Gerais, Planalto. Acolhimento
presencial, de segunda a sexta, 7h–15h30 (álcool e drogas por demanda
espontânea; demais casos, via encaminhamento).
• UBS e Hospital – Porta de entrada para avaliação clínica e
encaminhamento ao CAPS quando necessário.
• Em situação de emergência, procure a unidade hospitalar
mais próxima.
Falar sobre saúde mental é responsabilidade coletiva — em
setembro e em todos os meses. Informação qualificada, apoio da família e dos
amigos e acesso a cuidado profissional salvam vidas.
Os vídeos completos das entrevistas podem ser
assistidos nas plataformas digitais do F5.
 
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