Por Ingrid Pereira
Paulo Maia
Para definir o piso salarial da advocacia é preciso
considerar a realidade socioeconômica regional onde o profissional trabalha. É
o que afirma o presidente da seccional paraibana da Ordem dos Advogados do
Brasil, Paulo Maia, recém-eleito para seu segundo mandato.
Segundo o advogado, só é possível traçar valor mínimo
quando se trata de um “advogado empregado e regido pela CLT”. O piso salarial,
diz, deve contemplar “o atendimento das necessidades essenciais da subsistência
[do advogado] com a dignidade da profissão. Não é algo fácil. Muitos estados
possuem lei própria que define o valor do piso salarial do advogado”.
Em relação aos principais gargalos enfrentados pela
advocacia em seu estado, Maia destacou que há ineficiência do Judiciário
estadual que, além de ser excessivamente lento, sofre com a insuficiência de
servidores. "Na Paraíba há necessidade de cinquenta juízes para o preenchimento
das comarcas do estado. Mas há também o quadro insuficiente de servidores, que,
por sua vez, não são capacitados para as novas exigências do Judiciário frente
aos serviços prestados à sociedade", explica o advogado.
Leia a entrevista:
ConJur — Quais os
principais gargalos da advocacia no seu estado?
Paulo Maia — A atual ineficiência do Poder Judiciário
Estadual, sobretudo no primeiro grau, onde tanto nas comarcas de primeira
entrância, situadas em cidades mais carentes, como nas localizadas nos grandes
centros, se lida com excessiva demora na prestação jurisdicional. Essa situação
decorre, entre outros fatores, da baixa capacidade instalada do Poder
Judiciário no Brasil, que nada mais é do que a falta de juízes em diversas
comarcas. Na Paraíba há necessidade de cinquenta juízes para o preenchimento
das comarcas do estado. Mas há também o quadro insuficiente de servidores, que,
por sua vez, não são capacitados para as novas exigências do Judiciário frente
aos serviços prestados à sociedade. Tudo isso torna extremamente difícil o
trabalho da advocacia, cujos efeitos diretos, contudo, são percebidos na
sociedade e no cidadão que busca o Judiciário.
ConJur — O Tribunal
de Contas da União decidiu, em novembro, que a OAB deve prestar contas ao
tribunal. Como o senhor avalia a medida?
Paulo Maia — Entendo, com todo respeito ao TCU, que essa
decisão não tem qualquer efeito jurídico. Na ADI 3026, o Supremo Tribunal
Federal debruçou-se sobre a natureza jurídica da OAB e declarou que a Ordem não
se submeteria aos mesmo ditames que são impostos aos órgãos da administração
pública direta e indireta por não se constituir em entidade desta estrutura. O
entendimento foi de que a Ordem é um serviço público independente, a lhe
conferir o caráter de uma categoria sui generis no rol das personalidades
jurídicas existentes no direito brasileiro, não estando também sujeita a
controle da administração. Com esta decisão, o Supremo reforçou a independência
da OAB para o cumprimento de suas atribuições sociais previstas no artigo 44,
I, do nosso Estatuto (Lei 8906/94).
ConJur — Quais as
principais prerrogativas desrespeitadas hoje?
Paulo Maia — Infelizmente nos deparamos com inúmeras
violações de prerrogativas da advocacia. O mais grave, além da violação em si,
é a não compreensão de que as prerrogativas são exercidas pelo advogado, mas
pertencem ao cidadão. Além de que, não são privilégios corporativos, mas
verdadeiras garantias da cidadania. O não atendimento de advogados por juízes é
uma das reclamações mais recorrentes, mas há muitas outras que impedem ou
dificultam o trabalho do profissional da advocacia prejudicando, assim, a
defesa do direito da parte que o procura.
ConJur — O direito
de defesa está enfraquecido?
Paulo Maia — Estamos passando por um momento de turbulência
social em que a população por não mais suportar a ineficiência do Estado frente
à grave questão da segurança pública e encontra respostas em soluções
veiculadas por vozes extremistas, que apresentam mecanismos já extirpados há
muito da vida em sociedade. Com isso, o direito inalienável e fundamental de
defesa é gravemente atingido: o advogado é equiparado ao criminoso ou ao crime
praticado e as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla
defesa são consideradas como entraves no combate à criminalidade e a corrupção.
ConJur — A OAB deve
se colocar politicamente a favor do direito de defesa?
Paulo Maia — A OAB sempre se colocará a favor do direito de
defesa, mesmo que sua posição seja contramajoritária, por entendê-lo como
direito fundamental individual e garantia de uma ordem social justa. Suas
posições nesse sentido são históricas, como, por exemplo,na apreciação pelo
Supremo da execução da pena após condenação em segunda instância. Na ocasião, o
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, na ADC 44, pedia a suspensão
da execução antecipada da pena de todos os acórdãos prolatados em segunda
instância, por entender que a Constituição assegura o cumprimento de pena só
após o trânsito em julgado da decisão.
ConJur — A OAB é
democrática internamente?
Paulo Maia — A OAB internamente é dividida em órgãos
colegiados, como as diretorias dos Conselhos Federal, das seccionais e das
subseções e os Conselhos Federal e seccionais. As discussões sobre os temas
mais relevantes na OAB sempre são submetidas aos seus órgãos colegiados, até
como condição de validade formal, o que revela sua natureza democrática.
ConJur — O que o
senhor espera do superministério da Justiça?
Paulo Maia — Compete ao Poder Executivo estabelecer os
critérios de sua organização interna, obviamente respeitando os fins sociais,
os fundamentos e objetivos da República Federativa do Brasil. Como cidadão e
destinatário das políticas públicas, espero que a nova estrutura do Ministério
possa atender os objetivos da pasta e entregar os serviços necessários e
indispensáveis ao combate à corrupção e a criminalidade.
ConJur — Qual o piso
ideal para um iniciante?
Paulo Maia — Só podemos falar de piso se estivermos a
tratar de um advogado empregado e regido pela CLT. Nesse aspecto, o piso
salarial cuida de um valor mínimo que deve ser pago considerando a realidade
socioeconômica regional onde o profissional trabalha, permitindo que se perceba
um valor que contemple o atendimento das necessidades essenciais de sua
subsistência com a dignidade da profissão. Não é algo fácil. Muitos estados
possuem lei própria que define o valor do piso salarial do advogado empregado,
nos termos do que prescreve a Lei Complementar 103/2000.
ConJur —
Recentemente, o presidente Bolsonaro manifestou contra o Exame de Ordem
aplicado aos recém-formados. Na ocasião, ele disse que o exame cria “boys de
luxo de escritórios de advocacia”. Em sua opinião, o modelo do exame precisa
ser revisto? A quem cabe fiscalizar o curso de Direito?
Paulo Maia — O Exame de Ordem não só pode como deve ser
alvo de contínua mudança, pois é ínsita à vida em sociedade a busca constante
pelo aprimoramento em todas as suas esferas e ele se revela como um importante
instrumento de valorização da advocacia em seu papel social de controle,
sobretudo em face de um cenário de proliferação descriteriosa e equivocada de
novos cursos jurídicos.
A fiscalização dos cursos jurídicos, pelo ângulo da
regulação ou supervisão educacionais, compete aos órgãos mencionados na Lei
10.861/2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior,
mas, convém salientar que a OAB tem competência por lei para fiscalizar a
advocacia enquanto profissão regulamentada. A portaria MEC 1.874/2005
determinava que a Ordem poderia protocolizar junto à Secretaria de Educação
Superior comunicados sobre a existência de cursos jurídicos que apresentassem
indícios de irregularidades ou de condições precárias de funcionamento.
A fiscalização pela OAB é mais um mecanismo de controle da
qualidade dos cursos jurídicos, sendo, portanto, positivo sob este viés, e
cuida de uma ação naturalmente vinculada à aplicação do seu Código de Ética e
não da regulação ou supervisão educacionais.
ConJur — O senhor é
a favor de segundo turno nas eleições da OAB? O Conselho Seccional deve ser
eleito separadamente da chapa do presidente?
Paulo Maia — O processo eleitoral da OAB é muito parecido
com o processo eleitoral regido pelo Código Eleitoral e sofre constantes
mudanças, visando sempre conferir à escolha de seus representantes os mesmos
avanços das eleições gerais, mas guarda a cautela quanto a outros elementos,
principalmente de sua aplicabilidade às particularidades das eleições da ordem.
A eleição em turnos e a separação da votação do conselho seccional da do presidente
são aspectos do processo eleitoral da OAB que estão sendo observados e
avaliados para implementação.
***
Esta entrevista integra uma série de conversas com os
presidentes das seccionais da OAB eleitos para o triênio 2019-2021.
Conteúdo: Revista Consultor Jurídico
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