O anúncio da abertura de um
inquérito formal de impeachment contra o presidente dos Estados Unidos, Donald
Trump, feito nesta terça-feira (24) pela presidente da Câmara dos
Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados) marca o início de um longo
processo, em um instrumento raras vezes usado na história do país.
Somente três presidentes
foram submetidos a impeachment nos Estados Unidos até hoje. Os democratas
Andrew Johnson, em 1868, e Bill Clinton, em 1998, sofreram impeachment em
votação da Câmara, mas foram absolvidos pelo Senado. O republicano Richard
Nixon renunciou em meio ao processo, antes da votação da Câmara, em 1974.
O anúncio da democrata Nancy
Pelosi ocorre depois de meses de pressão de algumas alas do Partido Democrata,
e foi motivado pela acusação de que Trump teria tentado pressionar o presidente
da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, a investigar o filho do ex-vice-presidente Joe
Biden.
Biden lidera as pesquisas de
intenção de voto do lado democrata para a eleição presidencial em 2020 e, caso
seja escolhido como candidato do partido, irá enfrentar Trump nas urnas.
A abertura do processo não
significa que a Câmara, onde os democratas são maioria, vai decidir votar pelo
impeachment de Trump. De todo modo, mesmo que o caso vá adiante, o Senado é
dominado pelo Partido Republicano, o que reduz as chances de ele ser condenado
em um eventual julgamento na Casa.
Dentre os 100 senadores, há
53 republicanos, 45 democratas e 2 independentes.
Como funciona o processo de impeachment nos EUA?
O impeachment é a aprovação
de uma acusação formal contra o presidente ou outra autoridade acusada de
cometer um crime. Conforme a Constituição americana, essa responsabilidade cabe
à Câmara dos Representantes.
A Constituição diz que o
presidente pode ser removido do cargo se for condenado por "traição,
suborno ou outros altos crimes e contravenções", mas não detalha que
crimes são esses. Historicamente, costumam ser crimes em que há abuso de poder
ou obstrução de Justiça.
Cabe à Câmara decidir se
vota pela aprovação do impeachment, ou seja, da acusação formal contra o
presidente, mas a Constituição não especifica quais os passos necessários até
chegar a essa decisão. Historicamente, é comum que haja inicialmente a
aprovação de uma resolução autorizando a Comissão Judiciária da Casa a realizar
investigações. Foi esta comissão que realizou investigações nos casos de Nixon
e Clinton, antes da votação no plenário.
Em seu anúncio, Pelosi não
deixou claro quais são os próximos passos imediatos. Atualmente, seis comissões
da Câmara já investigam Trump em razão de outras acusações não relacionadas ao
caso com a Ucrânia.
Durante seu processo
investigativo, a Comissão Judiciária pode realizar audiências, analisar
documentos e ouvir testemunhas para determinar se as acusações são passíveis de
impeachment. Ao final dessa investigação, se chegar à conclusão de que há
evidências fortes de crime, a comissão pode decidir recomendar que o plenário
da Câmara aprove um ou mais artigos de impeachment contra o presidente.
Na votação em plenário, é
necessária maioria simples para aprovar cada um dos artigos de impeachment, que
são votados separadamente. Ou seja, caso todos os 435 membros da Câmara votem,
são necessários 218 votos para aprovação. Hoje, há 235 deputados democratas, 1
independente e 199 republicanos na Casa.
Se pelo menos um dos artigos
for aprovado, ocorre o impeachment.
O que ocorre após aprovação de impeachment pela Câmara?
Caso o impeachment seja
aprovado pela Câmara, o presidente é submetido a um julgamento pelo Senado.
Esse processo é comandado pelo presidente da Suprema Corte, a mais alta instância
da Justiça americana. O presidente tem direito a advogados de defesa, e um
grupo de deputados da Câmara dos Representantes atua como a Promotoria.
O julgamento pode levar
meses. Ao final, os senadores votam pela condenação ou absolvição do
presidente.
Para que ele seja condenado,
são necessários os votos de pelo menos dois terços dos senadores.
Caso isso ocorra, ele deixa
o cargo e, em seu lugar, assume o vice-presidente (atualmente Mike Pence).
Quais são as acusações contra Donald Trump?
A gota d'água para o
movimento do Partido Democrata foi uma ligação telefônica em julho entre Trump
e o presidente da Ucrânia.
Na conversa, cujo áudio ou
transcrição ainda não vieram a público, o mandatário americano teria pedido que
seu interlocutor ucraniano investigasse Joe Biden e seu filho, integrante do
conselho de uma empresa de gás ucraniana. Joe Biden é um político filiado ao
partido Democrata, já foi senador e vice-presidente, durante o governo de
Barack Obama, atualmente concorre à indicação do partido para se tornar
candidato às eleições presidenciais do próximo ano.
Em troca, Trump teria
prometido "algum benefício" ao líder ucraniano, possivelmente ajuda
militar americana ao país. A verba destinada a esse fim foi retida nos últimos
meses, mas acabou liberada depois da revelação do caso.
Este veio à tona por meio de
um informante do setor de inteligência, cuja identidade não foi revelada. Nos
EUA, essa figura jurídica (whistleblower, em inglês) pode ser um funcionário
público ou privado que decide denunciar formalmente supostas irregularidades,
como fraudes, desvios éticos e riscos à saúde pública.
Para incentivar as
denúncias, esses informantes são protegidos por lei contra eventuais
retaliações, a exemplo de demissões ou transferências.
Outro ponto importante da
crise é que o governo Trump estaria tentando impedir que a denúncia do
informante fosse entregue ao Congresso, apesar de membros do setor de
inteligência a terem classificado como "urgente" depois de avaliarem
se a denúncia tinha credibilidade.
Segundo a lei americana, uma
denúncia do tipo deve ser compartilhada pelas autoridades com o Congresso em um
prazo de, no máximo, sete dias.
O governo Trump alega ter a
prerrogativa de manter a informação sob sigilo porque, entre outros motivos, o
alvo da denúncia (o presidente) não faz parte da jurisdição de um processo
desse tipo.
De acordo com a imprensa
americana, o telefonema entre Trump e Zelensky é apenas um dos pontos presentes
na denúncia do informante. Entretanto, foram divulgadas poucas informações
sobre o teor do documento.
Pelosi afirmou em seu
pronunciamento que Trump "violou seriamente a Constituição".
"Nesta semana, o presidente admitiu que pediu ao presidente da Ucrânia
para agir de forma a beneficiá-lo politicamente", declarou a presidente da
Câmara.
Para Pelosi, Trump traiu seu
juramento presidencial, a segurança nacional americana e a integridade das
eleições de 2020 — a conversa, segundo os democratas, expõe uma incitação à
interferência estrangeira nas eleições de 2020. O próprio Biden declarou nesta
terça-feira ser favorável ao impeachment de Trump por conta do caso.
Segundo uma pesquisa do
YouGov, 55% dos americanos apoiam o impeachment de Trump caso seja confirmado
que ele suspendeu o envio de recursos a fim de pressionar pelas investigações
contra o rival.
No Twitter, o presidente
americano comentou o pedido de impeachment e disse fazer parte de uma
"caça às bruxas". Ele disse que divulgará o teor da conversa.
"Vocês verão que foi
uma ligação muito simpática e totalmente apropriada. Sem pressão e, diferente
de Joe Biden e seu filho, NENHUM quid pro quo (expressão em latim que quer
dizer algo como "trocar uma coisa por outra"). Isto é nada mais do
que a continuação da Maior e mais Destrutiva Caça às Bruxas de todos os tempos!",
acrescentou.
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