Auxílio emergencial a bilionário dono da Havan coloca programa em xeque - Grupo de hackers que vazou dados do dono da Havan e demais autoridades tentou cadastrá-lo no coronavoucher, mas Hang já estava como beneficiário
Por: Veja
Menos de 20 dias depois da polêmica do filho do apresentador
William Bonner constar na base de dados do auxílio emergencial, o programa de
transferência de renda do governo para trabalhadores informais — principal
medida de combate aos danos econômicos causados pela pandemia de coronavírus —,
está no centro de um novo escândalo: o empresário Luciano Hang, dono da rede de
lojas Havan, é um dos 55 milhões de beneficiários do chamado ‘coronavoucher’.
Hang não é nem informal e muito menos de
baixa renda, já que é listado como um dos bilionários do país na lista da
revista Forbes. Logo, o pagamento do auxílio emergencial no nome e no CPF do
empresário, mostra, mais uma vez, as gritantes falhas de segurança do sistema
de concessão do benefício. As seguidas fraudes colocam em xeque a funcionalidade
do programa mais celebrado da pandemia pelo executivo e acendem um alerta sobre
a fragilidade dos bancos de dados do governo.
Luciano Hang, aliado de primeira hora do presidente Jair
Bolsonaro, tomou conhecimento que seu nome estava na base de dados do auxílio
emergencial, inclusive com parcelas já pagas, nesta terça-feira, 2, após o
vazamento de dados pessoais do empresário e de autoridades pelo grupo de
hackers Anonymous, que tornou pública informações sigilosas na segunda-feira.
Em uma publicação no Twitter atribuída ao grupo, hackers tentaram usar o nome,
CPF, data de nascimento e o nome da mãe do empresário para cadastrá-lo no
auxílio emergencial. Porém, ao preencher os dados, o sistema da Caixa informa
que Hang já estava cadastrado e recebeu a primeira parcela de 600 reais do
programa. Em nota, o empresário condena o vazamento de dados pelo Anonymous e
pede investigações a Polícia Federal tanto pela divulgação de suas informações
pessoais como no cadastro indevido ao auxílio.
O auxílio emergencial é, pela lei, concedido a trabalhadores
informais (ou seja, sem registro em carteira), microempreendedores individuais,
autônomos que contribuem para o INSS e também beneficiários do Bolsa Família. O
principal requisito do programa é ter renda de até meio salário mínimo (522,50
reais) ou até três salários mínimos na família (3.135 reais). Além de não ter
contrato, o pleiteante não pode ser aposentado ou pensionista, receber
seguro-desemprego ou ser funcionário público. Quem não é cadastrado no CadÚnico
ou recebe Bolsa Família precisa se inscrever em um aplicativo da Caixa
Econômica. Os dados do cadastro são passados para a Dataprev, que é quem deve
verificar se aquele CPF têm direito ao auxílio. A empresa de tecnologia do
governo cruza os dados informados na porta de acesso ao auxílio emergencial com
17 bancos de dados, entre eles o Cadastro Nacional de Informações Sociais
(Cnis), onde há dados de contribuições previdenciárias e benefícios recebidos.
Também são checados bancos de dados de vínculos empregatícios e da Receita
Federal. A função desses cruzamentos é identificar se o candidato ao benefício
faz realmente jus ao benefício. Depois do cruzamento, os dados são enviados ao
Ministério da Cidadania, que é quem dá o aval definitivo para o pagamento e, só
depois o CPF é liberado para a Caixa. Se tiver renda maior, por exemplo, há o
bloqueio. Porém, a prática não funciona como a teoria. É gravíssimo que um
sistema cheio de fases — inclusive com a homologação feita pelo Ministério,
permita esse tipo de fraude.
A ineficiência do pagamento do auxílio emergencial levanta
questionamentos sobre a ampliação do ‘coronavoucher’ em um momento que o
governo decide se abre mais os cofres públicos para pagamento de parcelas
emergenciais do auxílio. O Ministério da Economia já admite cálculos para saber
quantas parcelas e qual o valor pode ser pago. Até o momento, o governo já
disponibilizou 154 milhões para o pagamento das três parcelas do auxílio
emergencial e, ampliar, aumenta ainda mais o rombo nas contas públicas. Pelo
grande impacto econômico, é fundamental que a transferência de renda seja
segura, isto é, chegue nas mãos de quem precisa, e não fonte de golpes entre
espertalhões. Quem perde com tudo isso é o país, que desampara os vulneráveis e
tem sua capacidade de políticas públicas eficientes cada vez mais questionadas.