Considerada ofensiva e preconceituosa, a fala do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva sobre pessoas com transtornos mentais, proferida
nesta terça-feira, 18, durante evento sobre ações do governo para conter a
violência nas escolas, provocou reações.
"Temos quase 30 milhões de pessoas com problema de desequilíbrio de
parafuso, pode uma hora acontecer uma desgraça", disse Lula
ao citar dados da OMS (Organização Mundial da Saúde).
"Estou indignada com a fala capacitista do presidente
Lula, não apenas o uso inadequado, em forma de brincadeira, com "desequilíbrio
de parafuso", mas por associar pessoas com transtornos mentais à
violência", disse ao blog Vencer Limites a fundadora e presidente da
Associação Mãos de Mães de Pessoas com Esquizofrenia (AMME), Sarah Nicolleli.
"Dentro da população de pessoas com esquizofrenia, por
exemplo, tem uma pequena parcela que vai para a criminalidade, assim como
pessoas sem transtornos mentais também escolhem ir para o mesmo caminho",
afirma a especialista.
"Uma fala do chefe de Estado deveria ser respeitosa com
as pessoas que já padecem com a doença mental e, com eles, seus familiares",
completa Sarah Nicolleli.
Para o advogado Emerson Damasceno, presidente da Comissão
Especial de Defesa da Pessoa Autista do Conselho Federal da OAB e presidente da
Comissão de Defesa da Pessoa com Deficiência da OAB-CE, as afirmações do presidente
Lula são inaceitáveis.
"É lamentável, para dizer o mínimo, que o Presidente
Lula tenha uma fala tão capacitista nesse caso. Primeiramente porque
estigmatiza ainda mais quem já sofre diariamente o estigma do preconceito. Além
disso, porque vincula deficiência aos terríveis e criminosos massacres nas
escolas, quando sabemos que pessoas com deficiência sofrem diariamente, como
vítimas, da violência fruto do preconceito e do ódio, inclusive nas escolas.
Alunas e alunos autistas, com deficiência intelectual e demais deficiências são
vítimas, não algozes. Saúde mental é uma pauta seríssima e deve ser tratada
dessa forma, com a profundidade que o tema exige. Sem termos risíveis. E por
fim, por utilizar temos tão capacitistas. Tudo isso em menos de 30 segundos de
uma fala lamentável", diz o advogado.
"O governo Lula vem alcançando avanços quando encaminha
a regulamentação da avaliação biopsicosocial, ao retomar a Convenção Nacional
das Pessoas com Deficiência após 7 anos, através do refortalecimento do CONADE,
e quando cria um GT para combater os crimes de ódio, como o fez recentemente o
Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, no qual inclusive pude falar sobre
Capacitismo como convidado. Mas, além disso, deve haver o cuidado -
principalmente de sua autoridade máxima nos termos e, principalmente, quando
não dominar determinado assunto, se socorrer de especialistas do próprio
governo. E ouvir mais as organizações sociais, inclusive", observa
Damasceno.
"O presidente Lula não é obrigado a saber de tudo o
tempo todo, mas até mesmo pela sensibilidade que sabemos que ele tem, deve ter o
máximo cuidado com a própria comunicação. Pessoas com deficiência já sofreram
demais no governo anterior, o atual governo precisa ser exemplo na luta
anticapacitista. Não é favor algum, é obrigação", conclui o advogado.
Cenário preocupante - De acordo com Informe Mundial de Saúde
Mental, revisado pela OMS no ano passado, em 2019, quase um bilhão de pessoas -
incluindo 14% dos adolescentes do mundo - viviam com um transtorno mental.
"O suicídio foi responsável por mais de uma em cada 100
mortes e 58% dos suicídios ocorreram antes dos 50 anos de idade", destaca
a Organização.
"Os transtornos mentais são a principal causa de
incapacidade, causando um em cada seis anos vividos com incapacidade. Pessoas
com condições graves de saúde mental morrem em média 10 a 20 anos mais cedo do
que a população em geral, principalmente devido a doenças físicas evitáveis.
Desigualdades sociais e econômicas, emergências de saúde pública, guerra e
crise climática estão entre as ameaças estruturais globais à saúde mental. A depressão
e a ansiedade aumentaram mais de 25% apenas no primeiro ano da pandemia",
ressalta a instituição.
No estudo, a OMS salienta a necessidade urgente de aprofundar
o valor e o compromisso que damos à saúde mental, reorganizar os entornos que
influenciam a saúde mental, incluindo lares, comunidades, escolas, locais de
trabalho e serviços de saúde, reforçar a atenção à saúde mental
mudando os lugares, modalidades e pessoas que oferecem e
recebem os serviços.
A maneira pejorativa e ultrapassada usada pelo presidente
Lula para se referir às pessoas com deficiências mentais, "pessoas com
problema de desequilíbrio de parafuso", reforça estigmas e está muito
longe do comportamento de estadista tão alardeado por apoiadores do atual chefe
do executivo.
Comentários
Postar um comentário
Olá, agradecemos a sua mensagem. Acaso você não receba nenhuma resposta nos próximos 5 minutos, pedimos para que entre em contato conosco através do WhatsApp (19) 99153 0445. Gean Mendes...