Estudo de SP mostra como a mudança brusca de rotina afeta a saúde - Segundo o IBGE, cerca de 7 milhões de brasileiros trabalham de madrugada; rotina invertida gera uma série de complicações de saúde
Jornada
noturna de trabalho, segundo o artigo 73 da CLT, é aquela realizada entre 22h
de um dia até 5h da manhã do dia seguinte, em áreas urbanas; para trabalhadores
rurais, a legislação determina que o trabalho noturno está compreendido entre
21h e 5h em lavouras e entre 20h e 4h na atividade pecuária.
O último
Censo brasileiro sobre o tema, realizado em 2016 pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), apontou que ao menos 7 milhões de trabalhadores
brasileiros trabalham nesse período. Policiais, bombeiros, profissionais da
saúde, entre outros, trabalham em jornadas noturnas tradicionalmente.
Recentemente, para abraçar a demanda acelerada do estilo de vida das grandes
cidades, muitos setores estão entrando em modelos de atendimento 24 horas por
dia. Lanchonetes, mercados, conveniências e até academias começaram a manter
suas atividades madrugada adentro. Para isso, alguém precisa trocar o dia pela
noite.
A troca de
turnos é um movimento que esbarra em questões fisiológicas do corpo, como
explica a professora Frida Marina Fischer da Faculdade de Saúde Pública da USP.
“O nosso organismo tem uma programação genética em que ele está ativo durante o
dia e em repouso à noite. Todas as funções fisiológicas do organismo trabalham
harmonicamente para facilitar o sono noturno e manter a vigília diurna.
Existe uma
série de enzimas de absorção e de secreção de substâncias, produção de
proteínas, reguladoras da viscosidade sanguínea, produção de anticorpos, enfim.
Uma série muito grande de funções que são rítmicas e essas funções ficam
alteradas com o deslocamento do ciclo sono vigília. A mudança tem efeitos na
expressão de genes que vão fazer a regulação em vários osciladores rítmicos,
principalmente os osciladores periféricos como fígado, pulmão, pâncreas,
coração e até mesmo na memória”, explica.
Efeitos
no organismo
O corpo
humano não sai impune dessa brusca mudança de rotina. “Quando a pessoa trabalha
longas jornadas e dentro dessas longas jornadas ainda está incluído o trabalho
noturno, o risco de distúrbios metabólicos é de três a quatro vezes maior que o
normal, inclusive de diabete”, alerta a professora.
Trabalhadores
noturnos correm mais risco de sofrer de doenças cardiovasculares, distúrbios
gastrointestinais e metabólicos (diabete tipo 2; síndrome metabólica); câncer
(mama, próstata e colorretal); problemas de saúde mental, sobrepeso e
obesidade, além de problemas relacionados à reprodução. Os sintomas se agravam
com o acúmulo do tempo do trabalho à noite.
A
especialista argumenta que a vida contemporânea depende da contribuição de
profissionais que exerçam suas funções no período noturno. Postos de saúde,
hospitais, serviços públicos essenciais e afins. “Será que a gente poderia
abolir o trabalho 24 horas? Será que o mundo seria o mesmo? Será que nós
teríamos internet, telecomunicações funcionando, água tratada e energia 24
horas, segurança 24 horas, segurança pública? Não teríamos. E será que a gente
pode viver num mundo assim? Não podemos.”
Pelo caráter
insalubre da jornada, a legislação brasileira proíbe que menores de 18 anos
trabalhem em jornadas noturnas, que vão das 22h às 5h. Para os que exercem a
função, é previsto um acréscimo de até 20% no valor pago pela hora trabalhada,
o chamado adicional noturno. Além disso, as horas na jornada noturna são
menores. Segundo a lei, nas atividades urbanas, a hora é computada como sendo
de 52 minutos e 30 segundos.
Dessa forma,
o trabalhador vai receber por nove horas trabalhadas acrescidas dos 20% por uma
jornada de oito horas. “As pessoas que vão trabalhar nesses horários, primeiro
têm que saber o que esses horários vão causar para elas. Mas uma forma de
compensar o fato de a pessoa trabalhar em horários que fazem mal à saúde é
fazendo ela ganhar um salário melhor e ter um maior número de dias de folga
para se recuperar do trabalho. Ou seja, alguma compensação a sociedade tem que
dar para podermos ter tudo que é preciso”, finaliza Frida.
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