Entenda o debate sobre emendas parlamentares e Orçamento - Representantes dos poderes públicos fizeram acordo pela transparência
Na última semana, os Três Poderes da República anunciaram um
acordo para garantir a transparência, a rastreabilidade e a eficiência na
execução das emendas parlamentares ao Orçamento da União, como são chamadas as
alterações feitas pelos parlamentares no projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA),
enviado a cada ano pela Presidência da República.
O consenso foi anunciado após reunião de cerca de quatro
horas entre os representantes dos Poderes, na última terça-feira (20),
organizada emergencialmente depois que o ministro Flávio Dino, do Supremo,
suspendeu, neste mês, as transferências de praticamente todas as emendas
parlamentares ao Orçamento.
Mais que uma questão orçamentária, as emendas parlamentares
envolvem uma disputa política, já que permite o direcionamento do dinheiro para
bases eleitorais de deputados e senadores.
Ao menos desde 2015, o Congresso vem ampliando seu domínio
sobre o Orçamento da União. Na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2024, por
exemplo, foram inseridos mais de R$ 49,2 bilhões em emendas. Há dez anos, em
2014, esse valor era de R$ 6,1 bilhões.
Na Procuradoria-Geral da República (PGR) tramitam mais de uma
dezena de investigações sobre suspeitas de desvios no repasse dessas verbas.
Orçamento
secreto
A falta de transparência das emendas parlamentares levou o
plenário do Supremo a proibir, em julgamento de dezembro de 2022, o chamado
“orçamento secreto”, como foram apelidadas as emendas feitas pelo relator-geral
do projeto de Lei Orçamentária Anual. Esse tipo de emenda, cuja sigla é RP9,
não permitia identificar o congressista que definiu a destinação da verba federal.
Após a Supremo ter imposto restrições às RP9, contudo, os
congressistas passaram a utilizar outros tipos de emendas, como as apresentadas
pelas comissões permanentes da Câmara e do Senado (RP8) e as individuais de
transferência especial (RP6), para continuar a avançar no controle do orçamento
público de forma pouco transparente.
As RP6 de transferência especial, por exemplo, foram apelidadas
de “emendas Pix”, por permitirem repasses diretos a estados e municípios, sem
que seja necessário indicar onde ou como o dinheiro vai ser gasto. Isso
dificulta o rastreamento da verba pelos órgãos de fiscalização.
Nas decisões que suspenderam a execução dessas emendas, Dino
frisou que o Supremo já decidiu pela necessidade de que haja maior
transparência e rastreabilidade na liberação das verbas, conforme determina a
Constituição, não permitindo que as práticas do orçamento secreto continuem a
ser empregadas. O entendimento foi referendado por unanimidade pelos outros dez
ministros da Corte.
Cabo de
guerra
De seu lado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem
defendido, em manifestações públicas, um maior equilíbrio orçamentário, e que o
dinheiro das emendas seja direcionado pelos parlamentares em maior coordenação
com o Executivo, que é o responsável por aplicar as verbas públicas de acordo com
um planejamento mais amplo.
“É muito dinheiro que não tem critério no orçamento planejado
que a gente faz para o país”, disse Lula em entrevista à Rádio T, de Curitiba,
na semana passada.
Especialistas ouvidos pela Agência Brasil apontam para a
ineficiência na aplicação de recursos públicos por meio das emendas
parlamentares, uma vez que os congressistas, em geral, buscam atender demandas
com critérios, por vezes, pouco claros.
Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado,
Rodrigo Pacheco (PSD-MG), por sua vez, defendem com firmeza que é a própria
Constituição que garante a definição conjunta do Orçamento, numa colaboração
entre a Presidência da República e o Congresso. Concentrar esses poderes no
Executivo é que seria uma distorção da opção feita pelos constituintes,
argumentam.
Foi com a Constituição de 1988 e a redemocratização do país
que o poder sobre a definição do Orçamento, por meio de emendas, foi devolvido
ao Congresso, depois de ter sido em grande medida limitado pela Constituição de
1967, promulgada durante a ditadura militar e que concentrava no Executivo todo
o poder para dispor das verbas públicas federais.
Entretanto, foi somente a partir de 2015 que regras como a
impositividade, que torna obrigatória a execução de determinadas emendas
parlamentares, foram inseridas na Constituição.
Pelo compromisso recém-anunciado com o aval do Supremo, os
poderes Executivo e Legislativo têm até o fim de agosto para apresentar novas
regras que garantam a transparência, a rastreabilidade e a eficiência na liberação
das emendas parlamentares.
Por enquanto, não há sinalização de que possa haver um recuo
dos parlamentares sobre a ampla fatia que controlam do Orçamento, que,
atualmente, chega a um quarto das despesas discricionárias, ou seja, de todos
os gastos não obrigatórios à disposição do governo.
Na nota conjunta divulgada pelos Três Poderes, foi indicada
uma possível limitação no ritmo de alta das emendas, para “que elas não cresçam
em proporção superior ao aumento do total das despesas discricionárias”.
Confira abaixo os principais tipos de emendas parlamentares
ao Orçamento da União e qual o valor correspondente na LOA 2024, com dados do
Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop):
*Emendas individuais (RP6) - São previstas desde a
promulgação da Constituição de 1988. Desde 2015, se tornaram impositivas, isto
é, de execução obrigatória. Em 2024, foram autorizados R$ 25,1 bilhões em
emendas desse tipo, R$ 37,9 milhões para cada deputado e R$ 69,6 milhões para
cada senador. Do total, R$ 8,2 bilhões são de transferência especial, as emendas
Pix, que foram criadas pela Emenda Constitucional 105/2019. Até o momento, o
governo já pagou efetivamente R$ 14 bilhões das RP6 neste ano, dos quais R$ 4,5
bilhões em emendas Pix.
*Emendas de bancadas dos estados e DF (RP2 e RP7) - São
impositivas desde 2019. No orçamento de 2024, correspondem a R$ 8,5 bilhões,
dos quais R$ 1,7 bilhão foi pago até o momento. Cada estado pode arrecadar até
R$ 316,9 milhões.
*Emendas de comissões permanentes do Congresso (RP8) - Não
são impositivas nem previstas pela Constituição. A existência dessas emendas
consta na Resolução 1/2006 do Congresso Nacional. Cada comissão permanente da
Câmara, do Senado ou Mista pode apresentá-las. Em 2024, correspondem a R$ 15,4
bilhões no orçamento, dos quais R$ 7,4 bilhões já foram efetivamente pagos.
Comentários
Postar um comentário
Olá, agradecemos a sua mensagem. Acaso você não receba nenhuma resposta nos próximos 5 minutos, pedimos para que entre em contato conosco através do WhatsApp (19) 99153 0445. Gean Mendes...