A diplomacia em 280 caracteres: como as redes sociais viraram armas de guerra — e quem está impedido de ouvi-las
A diplomacia
tradicional, marcada por notas oficiais, intermediários e rituais silenciosos,
perdeu espaço na arena geopolítica global. Hoje, líderes mundiais utilizam
redes sociais como palco principal para anunciar decisões militares, responder
a ataques e até ameaçar nações inimigas. Em vez de documentos timbrados, temos
tweets. Em vez de silêncio estratégico, temos vídeos, frases de impacto e
hashtags.
Donald
Trump, por exemplo, confirmou recentemente os ataques dos Estados Unidos contra
três instalações nucleares do Irã diretamente em sua rede social, a Truth
Social, antes mesmo de qualquer declaração oficial do governo americano. Foi
uma publicação breve, mas com peso geopolítico gigantesco. A resposta do Irã
também seguiu a nova lógica: vídeos de mísseis sendo disparados foram
publicados por canais estatais no Telegram, enquanto porta-vozes do regime
usaram plataformas online para enviar mensagens à população e ao mundo.
Israel, por
sua vez, tem usado o X (antigo Twitter) como principal canal para divulgar
informações sobre os ataques ao território iraniano e as ofensivas sofridas.
Autoridades israelenses publicam atualizações em tempo real, incluindo vídeos
de operações militares, mensagens de alerta à população e comunicados
estratégicos do governo.
Nesse novo
cenário, as redes sociais não são apenas ferramentas de divulgação — são armas
políticas. As narrativas se tornam campos de disputa tão importantes quanto os
territórios. O conteúdo que viraliza primeiro tende a se consolidar como
verdade, mesmo que seja uma versão distorcida. A guerra da informação é
paralela e simultânea à guerra armada.
Mas esse
fluxo intenso e global de dados não é igualmente acessível a todos. Em muitos
países, a população não tem o direito de ver ou ouvir o que o mundo inteiro
acompanha ao vivo. O caso mais recente é o do Irã, que impôs um apagão digital
de até 97% entre os dias 17 e 21 de junho de 2025, durante o auge dos ataques
norte-americanos. Apenas a TV estatal permaneceu no ar, transmitindo a
narrativa do regime sem contraponto. O uso de VPNs cresceu de forma expressiva,
mas milhões de pessoas simplesmente ficaram sem acesso a qualquer outra fonte
de informação.
E não são
apenas os regimes autoritários que restringem o fluxo informacional. Países que
se apresentam como democracias também têm adotado medidas controversas que
afetam diretamente a liberdade de expressão. No Brasil, decisões recentes do
Supremo Tribunal Federal autorizaram a suspensão de perfis em redes sociais, a
responsabilização de plataformas por conteúdo de terceiros e até o bloqueio de
redes inteiras, como ocorreu com o X, por determinação do ministro Alexandre de
Moraes. Tudo isso em nome do combate à desinformação — um conceito necessário,
mas que vem sendo manipulado politicamente.
Esse novo
ambiente — marcado pela instantaneidade e pela descentralização da comunicação
— também coloca a população em um novo papel. As pessoas não são mais apenas
espectadoras. Cada curtida, compartilhamento ou comentário as torna
participantes ativas de uma guerra narrativa. É por meio dessas interações que
governos, exércitos e corporações testam, ajustam e amplificam suas mensagens.
E essa nova
diplomacia digital, embora mais rápida e direta, carrega dois lados: por um
lado, oferece liberdade sem precedentes para que todos vejam, questionem e
comparem versões dos fatos; por outro, dá aos governos ferramentas poderosas
para controlar narrativas e silenciar vozes, especialmente onde a internet é
limitada ou censurada.
Num mundo em
que a velocidade da mensagem vale mais do que sua profundidade, o desafio não é
apenas ter acesso à informação — é conseguir filtrar, compreender e resistir à
manipulação. Porque hoje, mais do que nunca, o que está em disputa não é só a
verdade dos fatos, mas o direito de conhecê-los.
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