Cinzas de queimadas e lama do RS formam mural em São Paulo - Obra do ativista Mundano é "grito" pelo fim do desmatamento no Brasil
Pintado com cinzas de queimadas da Floresta Amazônica, do
Cerrado, da Mata Atlântica e do Pantanal e com a lama que foi formada pelas
enchentes deste ano no Rio Grande do Sul, um imenso mural foi inaugurado nessa
quarta-feira (23) na capital paulista para pedir o fim do desmatamento no
Brasil.
A obra também é uma denúncia contra a família
Cargill-MacMillan, uma das mais ricas dos Estados Unidos e responsável pela
gigante do agronegócio Cargill Inc que, segundo ambientalistas, é uma das
corporações responsáveis pela ampliação do desmatamento no país.
O mural é de autoria do ativista Mundano e ilustra uma
floresta toda destruída ao fundo e a imagem da indígena Alessandra Munduruku em
destaque, segurando uma placa com a mensagem Stop the Destruction (Pare a
Destruição).
Com 1.581,60m², o megamural foi pintado na lateral de um
prédio da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, ao lado da rede varejista que fica a
dois quarteirões da Avenida Paulista. “Estou pintando a destruição com o próprio
pigmento da destruição, desde a seca até a enchente. Ao mesmo tempo, estou
diminuindo a minha destruição”, explicou Mundano.
“Esse trabalho é um grande grito, uma grande mensagem que
mandamos para o mundo inteiro para parar a destruição. Ele é ainda uma
homenagem para a Alessandra Korap (Alessandra Munduruku), que é uma grande
guerreira que defende a Amazônia”, disse Mundano, em entrevista à Agência
Brasil.
“O mural também é uma mensagem direta para a empresa Cargill,
que é a maior empresa de agro do mundo e que deixa um rastro de destruição e de
desmatamento na nossa cadeia produtiva na América do Sul”, acrescentou.
A escolha por retratar Alessandra Munduruku não foi por
acaso. Agraciada recentemente com o Prêmio Ambiental Goldman, um reconhecimento
a pessoas que se destacam no ativismo ambiental de base, Alessandra tem lutado
contra o projeto da Ferrogrão, que prevê a construção de uma ferrovia no trecho
entre Sinop (MT) e Itaituba (PA), obra que tem provocado preocupações
relacionadas a violações de direitos humanos e impactos socioambientais.
“A Alessandra foi reconhecida internacionalmente pelo maior
prêmio de meio ambiente do mundo. Ela é uma gigante que está lutando contra a
construção da Ferrogrão, que a Cargill e outras empresas defendem, e que vai
ser uma bomba para todo o bioma dali. A obra facilitaria o escoamento da soja,
mas isso seria irreversível para a Amazônia e para o planeta”, disse Mundano.
De acordo com o artista e também com ambientalistas, a
família Cargill-MacMillan não tem cumprido os compromissos de acabar com o
desmatamento. A Cargill, dizem eles, continua adquirindo produtos de áreas
desmatadas e apoiando o projeto de construção da Ferrogrão.
“O mural é só um lembrete para eles [da Cargill] cumprirem
promessas que eles mesmos criaram, de que no ano que vem iriam acabar o
desmatamento em sua cadeia de produção”, cobrou Mundano.
O mural foi executado em parceria com a Campanha Burning
Legacy da Stand.earth, que se comprometeu a levar a mensagem para a porta da
família Cargill-MacMillan, nos Estados Unidos. A ideia é entregar a eles uma
série de cartazes que foram criados por Mundano com lideranças indígenas.
Cada cartaz trará o nome de um membro da família impresso com
as mesmas cinzas que foram usadas na produção do mural e uma frase cobrando
“Cumpra Sua Promessa – Pare a Destruição”.
Inauguração
A inauguração dp mural contou com a participação de
representantes do povo Guarani que vive no território indígena do Jaraguá, na
capital paulista.
“O mural é uma mensagem que eu acho que é para o mundo todo.
É muito importante a gente pedir de coração para todo mundo parar a destruição
e olhar um pouco mais para os povos indígenas que são as pessoas que cuidam da
natureza”, disse Daniel Wera, auxiliar comunitário dos Guaranis.
Para ele, o fato da obra trazer ilustrada uma liderança
indígena feminina é uma grande mensagem para o mundo. “Alessandra é uma mulher,
uma guerreira que luta muito com a sua comunidade. Ela conseguiu a demarcação
de seu território. A gente acredita muito na força do espírito e dos nossos
ancestrais. Então quando a gente remete a uma voz da floresta, da Amazônia, que
está lutando tanto pelo seu território, a gente vê tudo o que a gente e nossos
ancestrais passaram também”.
Wera defende que a mudança necessária para se acabar com o
desmatamento e a destruição da natureza em todo o mundo passa pelo diálogo. E
um diálogo que dê voz também aos povos indígenas. “É só uma questão de diálogo,
de abrir o diálogo e realmente dar voz para as lideranças, para os povos e para
todos os territórios tomarem as decisões. Já basta dos políticos tomarem as
decisões, já basta de quem veio da Europa tomar as decisões”.
Outros
trabalhos
Outro mural, instalado em Porto Velho (RO) e criado por
quatro artistas locais, também faz denúncia sobre as queimadas na Amazônia. Com
25 metros de extensão, o mural foi pintado pelos artistas Silva, Nath, Rabsk e
Latrop, e retrata como as belezas e riquezas do bioma estão sendo destruídas
por fogo, ação humana e mudanças climáticas.
Localizado na Avenida Jorge Teixeira, na esquina com a
Avenida Amazonas, a obra se concentra na palavra Amazônia. Cada letra, com
cerca de três metros de largura, destaca um aspecto da região. Juntas, elas
formam mais que o nome do bioma: elas contam a catástrofe que tem se repetido
nas últimas décadas e se agravado nos últimos anos.
O mural, que recebeu o nome de Amazônia em Chamas, traz
mensagem de resistência para lembrar que todos podem interromper a trajetória
de destruição da floresta, que está sendo colocada cada vez mais perto do ponto
de colapso.
Inauguração
Na capital paulista, um novo mural será inaugurado na próxima
sexta-feira (25), chamando a atenção para as emergências climáticas. O mural,
do artista Pixote, também está sendo pintado com tintas feitas de cinzas de
queimadas de florestas brasileiras e destaca o trabalho dos brigadistas
florestais voluntários no combate ao fogo.
Este mural faz parte do Festival Paredes Vivas - Edição
Cinzas da Floresta, que já passou por Campo Grande (MS), Fortaleza (CE),
Goiânia (GO) e Belém (PA). Na capital paulista, a obra está sendo pintada na
Rua Palestra Itália, 97, na zona oeste da capital.
Outro lado
Procurada pela Agência Brasil, a Cargill informou que
“respeita a liberdade de expressão do artista [Mundano]”, mas ressaltou que “o
mural baseia-se em relatório que é impreciso e as afirmações nele contidas
deturpam o trabalho da Cargill e as nossas cadeias de abastecimento”.
“O fato é que a Cargill acelerou o seu compromisso de eliminar o desmatamento e a conversão de terras das nossas cadeias de abastecimento direta e indireta de soja, milho, trigo e algodão no Brasil, Argentina e Uruguai até 2025. Estamos no caminho certo para cumprir esse compromisso. Continuamos inabaláveis nas nossas ações para proteger os direitos humanos, aumentar a sustentabilidade e proporcionar cadeias de abastecimento livres de desmatamento”, disse a empresa, por meio de nota.
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